sexta-feira, fevereiro 29, 2008
Missão terminada... Não foi surpresa… Soube-o assim que o reencontrou, tantos anos depois…
Nunca conseguira compreender porque fugira dele, então… Sentira aquela emoção intensa, inexplicável... E em simultâneo uma qualquer força desconhecida que a impelira a desaparecer, cortar laços, ligações ainda por estabelecer… Sempre pensara que fora o seu pavor de criar raízes, de se sentir amarrada, aprisionada… Mas não, não fora esse o motivo...
Agora sabia que não teria sido capaz de cumprir a tarefa que lhe estava destinada… Porque nesses tempos ela era igual a ele, convictamente descrente apesar das muitas evidências… O que fazia pelos demais fazia-o de modo não consciente, emocionalmente desapegada daqueles que auxiliava, surpreendendo-se frequentemente a si mesma com interrogações e porquês sem, contudo, obter respostas imediatas…
E ele, tal como no presente, não despertaria da dormência em que o prostravam… Porque céptico quanto baste para considerar que são coisas de outro mundo, não lhe chegam, não o atingem… porque o mal não existe, existe, quando muito, a ausência do bem…
Se o mal não existe como poderíamos identificar o bem…!?
O mal existe, sim, e muito mais disseminado do que a maioria do comum mortal imagina sequer possível…
Do mesmo modo que a luz só é confirmada pela sua ausência, nesse estado a que chamamos escuridão… A escuridão impede a visão, tal como o mal causa dano ao bem… Por algum motivo se associa o mal à escuridão e o bem à Luz…
Não lhe competia a ela, porém, convertê-lo… E muito menos quando os unia um sentimento além vida, além todas as vidas acontecidas e por acontecer, indestrutível, inquebrantável…
Ele que acreditasse no que bem entendesse, que o arbítrio sempre foi, é e será livre e longe dela querer mudar seja quem for… Cada um é quem e como é e tem todo o direito a sê-lo sem condicionantes ou limitações impostas por donos de verdades que são tudo menos absolutas, porque a verdade não tem dono e para cada uma das verdades como tal proclamadas existem, pelo menos, duas versões diferentes, não raro opostas, consoante a perspectiva sob a qual são interpretadas… E ela (im)perfeita na sua humana condição, jamais se considerara dona de qualquer verdade… Tampouco se arrogava o direito de ser mais sabedora e conhecedora da vida do que os demais…
Por conseguinte,e apesar de - ou sobretudo por... - a ele se haver entregue incondicionalmente e de nas mãos dele haver depositado a sua própria vida, facto inédito em alguém como ela, sempre dona de si mesma, nada faria para o convencer do que quer que fosse…
Ele que observasse, analisasse e concluísse por si mesmo… Ele que despertasse do marasmo em que se arrastava, alheio ao mais simples, porque incómodo, pensamento que lhe mostrasse tudo o que (não) poderia ser e fazer por si mesmo e por aqueles que deveria proteger e cuidar… Ele que (re)agisse, se assim o entendesse…
Não era incumbência dela viver a vida por ele, tomar as decisões por ele, cuidar dos dele por ele… Nem sequer estava previsto que sofresse as dores dele nem que se arrastasse nas angústias dele…
A imparcialidade é incompatível com o envolvimento emocional… Porém ela conseguiu, finalmente, distanciar-se o bastante das suas próprias emoções para compreender que nada mais poderia fazer por ele... Porque não adianta tentar acordar quem insiste em continuar adormecido…
Esgotadas, pois, todas as probabilidades de sucesso deu por cumprida a sua missão, com votos de que ele saiba libertar-se dos espiritos obsessivos que o atormentam e encontrar o caminho da Luz e do Bem...
'Assim seja… assim se faça... para Bem de todos'...
Rabiscado por lua
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