O reverso do Natal...Detestava-o!...
Menina, ainda, lhe haviam desfeito a ilusão do Pai Natal, esboroando qualquer resquício de espírito natalício
que pudesse sobreviver à desmistificação…
A pantufinha na chaminé permaneceu hábito
e amanhecia Natal recheada com uma roupita nova ou um par de sapatitos,
que os outros já estavam gastos,
comprados pela mãe na feira do bairro, onde eram mais em conta…
A família era humilde, mas na mesa não faltava alimento:
as habilidades da mãe na cozinha resultavam em deliciosos filhós de abóbora
a alegrar a consoada e um certo natal chegou mesmo a provar bolo-rei
cozinhado pela mãe, com mais massa do que frutas,
mas que, ainda assim, lhe soube pela vida…
Ficou-lhe para sempre na memória o gostinho desse bolo-rei…
Árvore de Natal? Claro que não! E para quê…?!
Meramente decorativa e, ademais, prejudicial
que aos pinheiros cortados era dado fim de vulgar lixo
passadas que fossem as festas…
Não, não havia árvore de natal… e nunca lhe sentiu a falta!
Em noite de consoada havia sempre alegria e sorrisos nas redondezas…
e nos restantes dias do ano, incluindo os de aniversário, tudo era tão diferente… curiosa, tratou de observar, escutar, analisar tudo e todos…
e rapidamente concluiu que o Natal não celebrava coisa nenhuma,
antes consistia em farta homenagem a Santa Hipocrisia
a que, anos mais tarde, se juntou São Consumismo,
em excepcional promoção dos ‘abades comerciantes’
apoiados pela ‘madre publicidade’ e por ‘frades desatinados’
que crêem ser a matéria melhor alimento para a alma dos seus 'pupilos'
do que gestos de carinho, de amor e de ternura…
a miséria espiritual no seu melhor!
Muitos Natais depois, alguns passados a recato de outros seres viventes
e que foram, de todos, os melhores, porque em paz consigo mesma,
continuava a detestar essa época
em que os sorrisos são fingidos na circunstância do evento
e se lamentam presentes dados a este ou àquela,
que "até nem os mereciam, mas, enfim, por ser Natal"...
Detestava o Natal - ponto final.
(imagem recolhida online)